quinta-feira, 31 de julho de 2008

Sem limites


Todos nós sorrimos e achamos graça quando lemos muitas das descrições e tentativas de explicação dadas pelos nossos antepessados aos diversos fenómenos naturais observados pelo Homem desde a Antiguidade. Actualmente os fenómenos já são explicados de forma científica e a crendice está arredada de grande parte do mundo, pelo menos no Ocidental/Europeu. Será?

Isto tudo vem a propósito de um e-mail que me foi enviado por diversas vezes no Verão passado e que este ano voltou à carga, com mais umas quantas aparições.

Reza o mesmo e-mail que devido a uma conjugação astral, o planeta Marte ir-se-á aproximar tanto da Terra num dia qualquer de Agosto que ao olharmos para o firmamento veremos não uma, mas duas luas!

Acredito que quem me envia estas historietas o faça com boas intenções, no sentido de ensinar mais alguma coisa aos restantes, mas quando se confrontam com coisas desta dimensão e em temas que não dominam, não se questionarão e não terão a tentação de ir à procura de respostas, como eu faço?

Se Marte se aproximasse tanto da Terra como este e-mail afirma, eu nem quero imaginar as convulsões gravíticas que tal fenómeno provocaria no Sistema Solar, pelo menos nos planetas interiores!

Afinal, quando sorrimos e achamos graça com a leitura dos textos antigos de que nos rimos nós?

Quando penso em quem inventa estas coisas só dá para perceber que a estupidez humana não tem limites…

Nota: a imagem deste post foi retirada da wikipedia (http://en.wikipedia.org/wiki/Mars) e, segundo essa página, é uma imagem de Marte obtida pelo telescópio espacial Hubble (para os que não saibam, o telescópio espacial Hubble é uma coisa tipo binóculo, mas só com uma lente, que anda lá por cima no espaço)

terça-feira, 29 de julho de 2008

26 de Abril


Esta história passa-se em Portugal, no ano de 2008, 34 anos depois da chegada da liberdade e de todos os sonhos e alegria recalcados durante 48 longos anos.

Esta história passa-se em Portugal, na cidade de Lisboa, capital de um país onde ainda há liberdade, mas onde já não há nem sonhos nem alegria.

As personagens desta história são uma piscina municipal, uma Câmara Municipal, uma Junta de Freguesia, um partido político que detem actualmente o poder na câmara municipal, outro partido político que detem actualmente o poder na junta de freguesia, um protocolo, um Presidente da Junta de Freguesia e vários cidadãos que tiveram a infelicidade de ficar no meio de tudo isto.

Em tempos foi assinado um protocolo entre a Câmara Municial e as várias Juntas de Freguesia onde se situavam as diversas piscinas municipais, através do qual ficavam as Juntas de Freguesia com a gestão das tais piscinas, comprometendo-se a Câmara Municipal a transferir para as Juntas de Freguesia as verbas necessárias para tal.

Mudam-se os tempos e mudou-se também o poder instalado na tal Câmara Municipal. E com essa mudança de poder veio uma mudança de gestão dessas piscinas, passando as mesmas a serem geridas directamente pela Câmara Municipal.

Nesta fase da história entramos no 2º acto deste folhetim e entram em cena as últimas personagens da história, os tais cidadãos que tiveram a extrema infelicidade de se verem metidos no meio deste enredo.

Em pelo menos uma dessas piscinas, os cidadãos que lá prestavam serviços estão à espera dos pagamentos devidos há algum tempo. A Junta de Freguesia achou por bem não pagar mais nada, já que a gestão da piscina passou para as mãos da Câmara Municipal. Esta, por seu lado, acha que não tem que pagar nada pois, para além dos valores em dívida dizerem respeito ao período em que a piscina ainda estava sob a gestão da Junta de Freguesia, ainda alega que os fundo para cobrir essas despesas foram transferidas para a Junta de Freguesia. No meio ficaram os tais cidadãos que trabalharam e ainda não receberam.

Instado pelos cidadãos, o Presidente da Junta de Freguesia responde sempre que já não é com ele, que agora é com a Câmara. Mas como os cidadãos não ficaram satisfeitos com tal resposta, pois na altura a que dizem respeito os pagamentos em atraso quem “mandava” na piscina era a Junta de Freguesia, começaram a pressionar ainda mais o Presidente da Junta a responder à questão “Porque não nos pagam?”. Finalmente a resposta veio: “Por motivos políticos!”

E é assim, no Portugal de 2008, 34 anos depois da chegada da liberdade e de todos os sonhos e alegria recalcados durante 48 longos anos, na cidade de Lisboa, capital de um país onde ainda há liberdade, mas onde já não há nem sonhos nem alegria, que as coisas se passam. Uma Câmara Municipal presidida e gerida por um partido, uma Junta de Freguesia presidida e gerida por outro partido (que até tem por hábito arvorar a bandeira da defesa dos trabalhadores), um punhado de cidadãos a quem não lhes pagam o que lhes é devido e uma resposta: “Por motivos políticos!”.

Dêem-nos um 26 de Abril que nos traga de volta a alegria e os sonhos do dia 25, que nos traga “as bandarilhas de esperança” para que “afugentamos a fera” que embora mais mansa, ainda nos esmaga e magoa nesta praça do Outono da liberdade. E que o o “Tejo que” leva “as águas correndo de par em par”, lave este país desta corja dirigente que da esquerda à direita vai matando este país.

Para quem ler este post peço que o distribuam por e-mail para os vossos contactos. Pode ser que este tipo de atitudes seja o nosso 26 de Abril, para que os sonhos e alegrias regressem neste país de fera amansada, onde o inteligente não manda acabar com as canções, mas de onde as “bandarilhas de esperança” desapareceram para parte incerta.

Um grande beijo para uma das cidadãs participante nesta história.

domingo, 27 de julho de 2008

O elogio da loucura

Ontem à tarde o meu pai veio-me chamar porque estava a dar na RTP-N “um programa sobre a Gare do Oriente”. Como o tema me interessou logo à primeira lá liguei a televisão na RTP-N e fiquei a ver o tal programa chamado “Obra de Arte”, o que não deixa de ser curioso pois esse é um dos nomes que eu mais utilizo para designar aquela aberração do Oriente. O programa de ontem não era apenas sobre a "Obra de arte", mas sobre a Expo-98.

Quando me liguei estava a falar o Engº. António Laranjo na qualidade de antigo presidente da GIL – Gare Intermodal de Lisboa, SA.

Depois dos habituais e rasgados elogios à obra do Arquitecto Calatrava e ao próprio autor, foi-lhe colocada a questão do conforto que a estação [não] oferece aos passageiros. E a resposta deixou-me pasmado. Corroborou a ideia do Senhor Arquitecto, à qual já fiz referência aqui, de que aquilo é uma estação de passagem, e não uma estação terminal! Depois ainda há a agravante do nível a que se encontra a estação, mais elevado em relação à envolvente, em pleno viaduto, o que, para este senhor, não possibilita tais luxos! Mas mesmo assim aquela estação (OK, vou usar este termo, embora de forma inadequada) é um must, já que consegue juntar muitos meios de transporte num único local, desde os comboios ao metro, passando pelos autocarros e táxis. E ainda conseguiram fazer uma referência, como fazendo parte de todo este bolo, à ligação fluvial!

Eu fiquei siderado quando ouvi tanta barbaridade e estupidez num tão curto espaço de tempo!

Desde quando é que uma estação, por ser apenas de passagem e não terminal, implica que se descure o conforto? É curioso, mas todas as estações do eixo Norte-Sul servidas pela Fertagus são de passagem, mas conseguem ter uma cobertura que proteje os passageiros das inclemências meteorológicas.

E o facto de ser elevada não permite melhor que aquilo? Nem preciso sair de Lisboa para dar 3 (três) exemplos de estações ferroviárias elevadas e nas quais nunca vejo ninguém à chuva: Sete Rios, Entrecampos e a metropolitânica Campo Grande. Será que o Senhor Engenheiro Laranjo nunca viajou para além da Gare Intermodal de Lisboa?

E quanto às grandes admiração e excitação provocadas pelo grande interface que é a Gare Intermodal de Lisboa, será isso uma coisa assim tão original que mereça tão grande destaque e alvoroço? Lá fora há disso aos pontapés!

E é por estas e por outras que em Portugal, onde o dinheiro não abunda, se compram obras faraónicas que, como esta, são mal projectadas e completamente desfasadas da realidade e das necessidades, tudo porque quem deveria saber escolher e criticar estas coisas se limita a ficar deslumbrado com toda esta exuberância de formas e não tem a mínima sensibilidade (e, pelos vistos, no caso do Engenheiro Laranjo conhecimentos de ordem prática) para os aspectos mais prosaicos e funcionais das obras. E só vejo críticas como estas vindas de pessoas que não têm qualquer relação com o poder político (talvez porque actualmente as pessoas com alguma competência só querem é distância da política), nunca vejo ninguém que poderia ter feito alguma coisa para evitar tamanho erro a vir à praça pública pôr os pontos nos I’s em relação à GIL.

Já agora, digam lá quantas mais estações como esta, completamente aberta, o Senhor Arquitecto Calatrava fez! Se querem uma ajuda para a resposta a isto consultem este site: http://www.calatrava.com/main.htm

quinta-feira, 24 de julho de 2008

A nova ponte de Lisboa

Que impactos irá ter a nova ponte Chelas-Barreiro no Beato? Sim, no Beato? Esta é uma das questões que me têm atormentado nos últimos tempos, desde que a sua construção foi anunciada.

E refiro-me ao Beato (freguesia e zona da mesma freguesia) não só por morar lá, mas porque esta ponte trará mais implicações ao Beato que a alternativa Beato-Montijo, já que a opção escolhida atravessa a freguesia numa diagonal que abarca uma área muito maior de margem (ou, se preferirem, de terra firme) que a alternativa preterida que nem sequer passava pelo Beato-freguesia (assim como na margem esquerda não é no Barreiro que a ponte vai dar, mas sim no Lavradio)!

Seguindo a direcção de terra para o Rio, a ponte começará em terrenos que pertencem à freguesia de Marvila (mas meramente por uma questão administrativa, já que do outro lado da rua já é Beato) ocupados pela Escola Secundária Afonso Domingues, antiga escola industrial, que, para além do edifício principal, é composta por vários anexos de alguma dimensão, onde funcionam as oficinas das aulas práticas. É, actualmente, a única escola secundária da zona com turmas até ao 12º ano. Com o traçado da ponte a cair-lhe mesmo em cima, esta escola está condenada ao camartelo, tendo já lido que já não funcionaria no próximo ano lectivo (2008/09), facto que me custa muito a crer, mas sem nunca se ouvir falar de alternativa para a mesma. Provavelmente fechará definitivamente, sendo os estudantes que a frequentam ou que a frequentariam no futuro enviados para o degredo de alguma escola em Chelas.

Temos, para já, uma escola que já era.

Continuando a seguir o percurso da ponte, segue-se a Manutenção Militar. Também esta deverá ser desactivada, já que grande parte do trajecto que a ponte fará sobre Lisboa será por cima dos terrenos destas instalações militares. Apesar de já não ser a entidade empregadora que foi noutros tempos, ainda emprega muita gente, sendo esse facto uma importante fonte de rendimentos para a economia local, sendo que muito do comércio existente no Beato-zona vive bastante dependente desse mercado. Acabando a Manutenção Militar não consigo ver como irão sobreviver aquelas lojas (ou parte delas) apenas com os moradores locais, cuja maioria é composta de pessoas idosas com reformas baixas ou imigrantes.

Temos assim, uma escola, a Manutenção Militar e (indirectamente e, admito, bastante discutível) o comércio local, ou parte dele, a desaparecerem do mapa.

Continuando a viagem, cruzamos a Av. Infante D. Henrique e chegamos à Doca de Xabregas e, finalmente, ao rio.

Nesta zona irão existir um pilar ainda na doca e um outro já no rio, sendo este último um problema para a navegação, principalmente para as manobras de acostagem dos navios ao Terminal de Contentores de Santa Apolónia, de acordo com os pareceres da Administração do Porto de Lisboa. Para solucionar o problema terão que ser feitas obras para prolongar a doca mais para dentro do rio, com os inevitáveis trabalhos de aterro que isso implica. Como a actual doca tem menos de 10 anos de construção (as obras de ampliação começaram umas semanas antes do início da Expo-98, tendo o novo terminal entrado em funcionamento em 2000 ou 2001), pode-se dizer que este é um dos mais belos hinos ao génio do planeamento português!

Fazendo um balanço do que até agora foi dito:

  1. uma escola vai abaixo;
  2. a Manutenção Militar vai abaixo;
  3. o comércio local não deverá ficar de muito boa saúde com o fim da Manutenção Militar;
  4. terão que ser feitas obras nas instalações do porto de Lisboa que ainda nem 10 anos de uso têm.

Começando a juntar algumas destas coisas teremos mais algumas consequências interessantes para a freguesia do Beato.

Assim, juntando o 1. com o 2. (escola e Manutenção Militar abaixo) iremos ter menos população trabalhadora/estudante na freguesia o que, associado ao 3. (crise no comércio local) levará, quanto a mim, ao surgimento de mais uma (ou mesmo muitas) razão para a Carris fazer aquilo que tanto gosta de fazer nesta zona: redução de serviço. Os maiores candidatos à cacetada serão a carreira 39 e a 718. Em relação à primeira seria a cereja sobre o bolo para a Carris, já que finalmente haveria uma razão bastante forte para acabar de vez com esse serviço (sendo que já se ouvem há algum tempo boatos de que o seu fim está para breve). Já para a 718 os mais provável será assistirmos à diminuição da sua frequência. Na parte mais alta da zona, não creio que haverá mexidas nas carreiras que por lá circulam.

Haverá também, como não podia deixar de ser, o impacto que uma obra destas irá ter na zona, quer durante a construção, quer após a inauguração da ponte. Para a fase da construção pouco há a dizer, já que toda a gente sabe o que isso implica (barulho, pó, sujidade, poluição). Depois de concluída a obra virão os factores mais permanentes, como o barulho do tráfego da ponte, que por muito atenuado que seja continuará a haver, a poluição automóvel e, pelo que se conhece da Ponte 25 de Abril, todos os OVNIs que resolvam aterrar debaixo da ponte vindos lá de cima.

Para lá da ponte irá haver os acessos. Em termos ferroviários a linha dividir-se-á saindo ramos para o lado do Oriente (mas porquê, senhores, porquê?) e para o lado do Areeiro (essencialmente para os comboios suburbanos). Quanto ao trânsito rodoviário o mesmo irá desembocar na Av. Santo Condestável (!) de onde será distribuído para o interior da cidade (sim, digo para o interior da cidade pois não consigo ver como é que se poderá, naquela zona, construir ligações directas entre a nova ponte e, por exemplo, a AE Norte ou a CRIL). Com a ligação da ponte à Av. Santo Condestável tornar-se-á quase obrigatória a conclusão dessa avenida em direcção a Xabregas, o que implicará grandes trabalhos na zona da Estrada de Chelas e R.Gualdim Pais (com muitos realojamentos pelo meio) e a construção de um novo viaduto ferroviário em Xabregas, o que agravará a curto e médio prazo o caos provocado pelas obras (Xabregas ficaria/ficará sitiada de obras, com as da ponte a norte e as da Av. Santo Condestável a sul) e a longo prazo trará um aumento de trânsito considerável a toda aquela zona.

Será tudo isto pessimismo meu? Serei um velho do Restelo? A resposta será, provavelmente, sim, já que, apesar de eu ver tudo isto em tons tão sombrios, há quem veja em tudo isto a oportunidade que finalmente chega de reconverter toda aquela zona, nomeadamente a actual vereação da Junta de Frequesia do Beato que, para os menos crentes como eu, até chega a convidar as pessoas para que olhem para o outro lado da cidade e vejam o exemplo de Alcântara para que se constate as melhorias e a reconversão que aquela zona teve graças à Ponte 25 de Abril! Como resmungão que sou, olho para Alcântara como me pedem e não vejo nada disso. Só consigo ver a grande confusão de automóveis que sempre vi desde que me conheço, uma série de ruas amputadas e bairros divididos, coisas que só em adulto comecei a ver, já para não falar na chuva de objectos e no intenso ruído proveniente da ponte e que se ouve a grande distância durante as 24 horas do dia.

Em conclusão e juntando o oficialmente previsto e planeado com as minhas previsões e conjecturas temos:

1. O fim da única escola secundária que ainda existe na zona, sem que se fale na construção de uma alternativa;

2. O fecho da Manutenção Militar;

3. Crise no comércio local decorrente do fecho da Manutenção Militar

4. Diminuição da oferta de transportes por parte da monopolista CCFL

5. Realojamentos e consequente desmembramento de relações sociais em zonas onde o factor bairro e de vizinhos ainda tem um peso grande

6. Durante a construção os impactos negativos das obras de:

6.1. Construção da ponte

6.2. (Re)Construção da muralha e doca de Xabregas (obra que actualmente tem menos de 10 anos)

6.3. Conclusão da Av. Santo Condestável e respectivos acessos

6.4. Construção de novo viaduto ferroviário em Xabregas (acesso à estação de Santa Apolónia)

7. Após a conclusão de todas estas obras:

7.1. Aumento do tráfego automóvel na zona

7.2. Poluição atmosférica e sonora (apesar da promessa da implementação de medidas que diminuam o impacto ambiental)

7.3. Possibilidade de ocorrência de problemas de segurança (até hoje ninguém conseguiu ou quis resolver o problema dos objectos que caem ou são lançados da Ponte 25 de Abril, pelo que é justo considerar que no caso da nova ponte o problema poderá vir a ocorrer)

Espero que tudo isto seja mais negativista que a realidade, mas o que querem? Até hoje nunca nenhuma autoridade se mostrou realmente interessada na qualidade de vida das populações residentes ou trabalhadoras da zona, pelo que o meu cepticismo quanto a estas questões já me transcende.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

(Dis)Funcionais II

Depois das estações do metro desta vez vou-me dedicar a duas de caminhos-de-ferro: “Obra de arte” do Oriente e a Renovada do Rossio.

Começando pela obra de arte.

Aquela “coisa” sofre de má-formação congénita devida à ideia errada que o Sr. Arquitecto Calatrava tem daquilo que é uma estação ferroviária. Segundo essa sumidade, uma estação ferroviária é apenas um local de passagem, onde as pessoas se limitam a entrar e a sair de comboios. Para esta sumidade em arquitectura, na ferrovia, ao contrário do que se passa nas viagens aéreas, não há lugar a mudanças de comboio, a tempos de espera antes ou entre viagens como se as pessoas chegassem todas à estação 30 segundos antes da partida e tivessem sempre viagens directas desde a origem ao destino, e o resultado foi uma estação (penso que única em todo o Mundo) sem qualquer tipo de sala de espera – situação resolvida quase 10 anos depois, com a criação de umas jaulas de vidro no piso intermédio. Como se isso não fosse suficiente, o ego narcisista da sumidade sentiu-se ofendido quando soube da volumetria dos prédios da envolvente ao mamarracho e, como paliativo, resolveu aumentar a altura das palmeiras, tornando-as meros ornamentos de gosto duvidoso e iguais às de muitas outras obras do mestre, mas sem qualquer efeito práctico quanto à protecção dos infelizes passageiros contra os elementos.

Do ponto de vista ferroviário também esta obra de arte é uma aberração. Começa por ter sido imposta à CP (à época ainda não existia a Refer), que sempre quis ter a nova estação central de Lisboa na zona do Vale de Chelas. Curiosamente a estação do metro das Olaias (outra aberração para alimentar o ego de mais uma sumidade da arquitectura) foi construida com um acesso para o comboio, o qual, por motivos óbvios, nunca foi aberto. Também os terrenos nesse vale pertencem ao domínio público ferroviário. Para os interessados, se viajarem de comboio na linha de cintura verificarão que existe do outro lado do vale (ou o que resta dele) a muitas dezenas de metros da linha uma vedação verde, a qual marca o início da propriedade da Refer.

Em termos de operação, a obra de arte peca por ter apenas linhas de passagem, sem qualquer via de resguardo, o que implica que qualquer comboio que termine ali ou fica a ocupar linhas que poderiam ser usadas para outros comboios ou vai estacionar para outro sítio, sítio esse que se situa em Santa Apolónia, a cerca de 6 Kms de distância. Por causa disso, os actuais inter-cidades do Algarve e Alentejo, têm que fazer uma viagem de Santa Apolónia até ao Oriente e efectuar manobras para colocar a locomotiva no outro extremo da composição. Isto porque entretanto se quis justificar o custo daquela obra, já que esses inter-cidades podiam começar em Santa Apolónia, com percurso directo para a Linha de Cintura e Ponte 25 de Abril, sem necessidade de tais manobras (e que chegam a atrasar a marcha de outros comboios, principalmente os suburbanos).

Voltando à coisa do Oriente, segue-se a altura das plataformas das gares. Como é que é possível que, atendendo à época em que aquela obra foi feita, se tenham construido umas plataformas tão baixas? É a única estação em toda a rede de suburbanos de Lisboa, em que o piso dos comboios não fica à altura da plataforma! É incrível! Ainda relativamente às plataformas, mas desta vez falando da sua dimensão, qual foi a razão para as terem feito tão curtas? 309 metros contra, por exemplo, os 348 metros das maiores da velhinha Santa Apolónia com quase 150 anos! Poupança no material?

Como prémio para tanta estupidez, o Estado Tuga vai pagar agora não sei quantos milhões à sumidade para um projecto de alterações à obra de arte por forma a poder receber os comboios de alta velocidade e “corrigir alguns erros”! Porreiro, pá. Um tipo faz as coisas mal feitas e ainda ganha milhões para as corrigir! Só neste país!

Seguindo para a antiga “Estação Central”, vulgo Estação do Rossio.

Esta estação, a mais bonita de Lisboa, tem sofrido ao longo dos seus 118 anos de vida obras, não só de conservação, mas também de alteração para a adaptar às novas exigências.

Na primeira metade da década de 1990, foram efectuadas obras de aumento e alteamento das plataformas para acompanhar a chegada das, então, novas unidades 2300 (as “vermelhas” das linhas de Sintra e Azambuja) e em simultâneo criou-se um interface com a estação dos Restauradores do Metropolitano. Essa ligação ao metro faz-se através de várias escadas que partem das várias plataformas e que dão acesso a um patamar ou nível intermédio, quer directamente quer após se percorrer um corredor (no caso das escadas que saem junto aos topos das vias). Daí chega-se, através de uma escadaria, a um novo nível mais abaixo, já quase ao nível do átrio de entrada do Metro, passando-se depois para um corredor desnivelado (daí o “quase ao nível do átrio (…) do Metro”) por onde se chega à estação de Metro. Dito desta forma parece tudo bem. O tudo mal surge quando se vai lá e se vê com os olhos o que ou como é aquilo. O acesso à estação do metro propriamente dita obriga a que os passageiros voltem para trás, já que o último corredor do interface é enviezado (em linguagem de aviador fica em direcção às 4 horas de quem desce as escadas) e, no fim deste, as pessoas dão de caras com umas barreiras que as obrigam a virar à direita e depois voltar à esquerda numa volta de 180º. Finalmente chegam às cancelas do metro. Terá isto resultado de erros de cálculo? Não poderiam ter feito o átrio do nível intermédio mais curto de forma a que o acesso fosse directo?

Uns anos mais tarde, cerca de 10, o túnel do Rossio fechou pelos motivos que todos conhecemos, e a Refer aproveitou a ocasião para renovar todo o outro lado da estação, acabando definitivamente com o que restava do antigo CCTerminal. Como resultado, apareceu um novo acesso desde o átrio de entrada do lado do Largo D. João da Câmara até à gare, composto pelo átrio de entrada, um pequeno lanço de escadas que dá para um patamar intermédio, seguindo-se um grande (enorme) lanço de escadas até ao nível da Gare. Com isto tudo o espaço que fica entre o fim desse último lanço de escadas e a parede situada em frente não deve ultrapassar os 5 metros, e a isso ainda se juntam as máquinas de vendas de bilhetes (mesmo em frente às escadas) e as bilheteiras, que apesar de ficarem ao lado, ainda “geram muito trânsito” na área. Se do cimo das escadas olharmos para baixo ficamos com a ideia de ter havido ali, e mais uma vez, um erro qualquer de cálculo. Bastaria o primeiro lanço de escadas começar um metro mais atrás e o patamar intermédio ser mais curto para que aquele funil ficasse bem mais largo. Felizmente que a estação do Rossio já não tem o movimento que tinha antes do fecho do túnel, pois se assim fosse aquele funil seria uma confusão tremenda à hora de ponta. No passado dia 30 houve um pequeno “cheirinho” dessa confusão ao se terem sobreposto o dia de venda de passes com uma avaria na sinalização que provocou atrasos e supressões nos comboios. Só muito dificilmente se conseguia passar por ali.

E por aqui me fico.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Dúvida


USO DE TELEMÓVEL DURANTE A CONDUÇÃO
• A utilização de telemóvel durante a condução, só é permitida se for utilizado auricular ou sistema alta voz que não implique manuseamento continuado. A infracção a esta disposição é sancionada com coima de 120 a 600 euros e passa a ser considerada contra-ordenação grave. (Art.ºs 84.º e 145.º )

Isto foi tirando de um documento que me chegou por mail, sobre as alterações ao código da estrada. Sempre que vejo este artigo fico a pensar nos sistemas de rádio usados pelas várias empresas de transporte, desde autocarros a camiões, passando por táxis. Nesses sistemas o condutor sempre que fala tem que ficar com uma das mãos ocupadas a segurar no aparelho. Não será também isso uma transgressão como esta?

terça-feira, 8 de julho de 2008

(Dis)Funcionais

As estações de metro, seja em que parte do Mundo for, são, supostamente, estruturas concebidas e construídas tendo em mente a função a que se destinam, devendo ser, por essa razão, o mais racionais possível.
O mesmo se passa com as estações do Metropolitanto de Lisboa da fase pré-25 de Abril, inauguradas entre Dezembro de 1959 e Dezembro de 1972. Eram estruturas simples, extremamente racionais no seu desenho e, inicialmente, sóbrias e sem qualquer tipo de acessórios que a partir dos finais dos anos 1980 começaram a encher as estações do Metropolitano de Lisboa.
Nessa época as estações eram compostas por 2 níveis, sendo o inferior a gare (plataformas e vias), à qual se acedia por escadas existentes num ou em ambos os extremos das plataformas, que por sua vez faziam a ligação a um nível intermédio, constituído por um átrio onde se situavam as bilheteiras e as escadas de acesso à rua. A racionalidade deste desenho era espantosamente simples, sendo o percurso efectuado pelos passageiros bastante linear, descendo do nível da rua para o átrio no nível intermédio e deste para a gare, sem necessidade de “voltas atrás” nem mais desvios. Mesmos as estações apenas com átrio/saída num dos extremos eram funcionais e permitiram, mais tarde, o aumento do comprimento das plataformas de 2 para 4 e de 4 para 6 carruagens.
Em meados dos anos 1980 assiste-se a nova fase de crescimento da rede, depois de 16 anos de estagnação (se não tivermos em conta as obras que várias estações sofreram para aumento do tamanho das plataformas), com a inauguração em 1988 das extensões Sete Rios-C.Militar e Entrecampos-Cidade Universitária. As estações dessa fase diferiam das anteriores pelo facto de possuírem um único átrio central, situando-se as escadas de acesso às plataformas junto ao centro das mesmas. Embora fossem funcionais o trajecto feito pelo público nestas estações tornou-se mais “sinuoso” que nas anteriores, com os passageiros a entrar no tal átrio central, do qual saiam, geralmente, escadas dos dois lados para acesso às plataformas. Nesta fase “nasceu” a estação mais escondida da rede, a das Laranjeiras, com a entrada/saída para o exterior dentro de um pátio que por sua vez se situa no meio de alguns prédios, com uma passagem por baixo de um deles para a rua. Quando se sai da estação não há grande problema, o pior é quando se quer entrar nela e não se conhece bem a zona! É desta fase a ideia de tornar as estações de metro em obras de arte, com muitos paineis de azulejos, esculturas e pisos polidos impróprios para dias de chuva.
Seguem-se os anos 1990, altura em que surgiu aquilo a que eu chamo de “Geração Fantástica” em termos de estações de metro. Nesta época a obsessão do Metropolitano de Lisboa pela arte fê-lo esquecer por completo o objectivo das estações de metro, surgindo verdadeiros abortos arquitectónico-funcionais. Paradigma desta época é a estação Baixa-Chiado, onde se conseguiu juntar numa única estação os dois modelos anteriores, com escadas de ligação entre as plataformas e o átrio intermédio nos extremos das primeiras (como nas estações da primeira fase) e o átrio intermédio no centro da estação (como nas estações dos anos 1980). O resultado é uma aberração em termos funcionais, com os passageiros a serem obrigados a percorrer uma distância enorme desde que entram no átrio intermédio até chegarem à plataforma. Também a estação do Rato sofre do mesmo mal.
No Cais do Sodré a coisa ainda é pior. Começando pelo nível da rua, ninguém se lembrou de pôr aquela estação a servir aquela zona da cidade, não existindo uma única saída que atravesse a Av. 24 de Julho, obrigando muitas pessoas a amontoarem-se no estreitíssimo passeio existente entre a faixa bus e a faixa para o restante trânsito. Do outro lado da estação dos caminhos-de-ferro o interface com a Transtejo que era para ser desnivelado acabou por ser ao nível da rua, obrigando milhares de pessoas a atravessarem a Rua de Cintura do Porto de Lisboa, com as consequências que daí advêm quer em termos de segurança, quer em termos de trânsito. Descendo para a estação do metro propriamente dita, descobrimos uma estação onde temos que virar de direcção mais do que uma vez para finalmente chegarmos à plataforma. O caminho directo que existia nas antigas estações foi aqui completamente esquecido. São átrios, patamares e escadas que nunca mais acabam, com uma sinalização de duvidosa utilidade para quem não está familiarizado com tamanha confusão de estação. E como se isso não bastasse as paredes são forradas com um irritante coelho da Alice no País das Maravilhas a dizer que não tem tempo a perder.
Continuando cronologicamente para as seguintes, vamos até ao Terreiro do Paço e Santa Apolónia, últimas estações a serem inauguradas. A primeira não a conheço, apenas passei por lá, mas pelo que me deu a entender não existe, pelo menos para já, nenhuma saída directa do metro para a estação do Sul e Sueste, já que vejo muita gente a usar uma saída situada junto ao antigo terminal dos barcos do Seixal e Montijo, já perto da doca da Marinha, e a voltar para trás para a estação do Sul e Sueste. Se isto não estiver correcto agradeço quem me corrijam.
Segue-se Santa Apolónia, a qual já conheço melhor. Tem o mesmo defeito que o C.Sodré: não foi construída para servir aquela zona da cidade. Apenas tem saída para o lado do rio, onde não faz grande ligação a nada, já que fica afastada das paragens de autocarro existentes desse lado, e para o interior da estação de caminhos-de-ferro. E mesmo essa saída está mal situada, já que os passageiros são despejados directamente na gare de caminhos-de-ferro, longe das bilheteiras. Pode ser muito útil para passageiros de suburbanos que estejam munidos de passe ou de pré-comprados, mas e os outros? Ainda por cima e legalmente só podem circular pelas gares quem esteja munido do respectivo título de transporte. Dessa forma, aos passageiros que pretendam adquirir bilhete para o comboio têm a alternativa de seguirem “ilegalmente” pela plataforma da linha 5 em direcção à saída da estação até chegarem à bilheteira, ou sairem da estação e irem pela rua voltando a entrar na estação uns metros mais à frente. E teria sido tão simples terem feito qualquer coisa de bem feito neste caso. Bastaria terem construido outro átrio ou o mesmo mas mais a sul e com saída no átrio principal da Estação de Santa Apolónia mesmo junto às bilheteiras!
E assim se faz a história das estações do Metro de Lisboa, com várias fases bem distintas e com a funcionalidade das estações a desenvolver-se de forma inversa ao do desenvolvimento preconizado pelas florezinhas e outras mariquices que enfeitam as estações actualmente.
Mas se calhar "é disto que o meu povo gosta"!

terça-feira, 1 de julho de 2008

O grande sucesso dos transportes públicos portugueses

Ultimamente têm-se repetido as notícias na comunicação social que referem o aumento do número de utentes dos transportes públicos nacionais, situação que não se registava há vinte anos. Todos os transportadores estão satisfeitos com isso, o que é natural, e, penso eu, qualquer defensor do uso dos transportes públicos como base de uma sociedade sustentável quer ecológica, quer economicamente também o está.
Mas o problema do actual contexto surge quando se pergunta aos novos utentes dos transportes públicos o que os levou a mudar. A reposta é, invariavelmente, o custo dos combustíveis. Nenhum ou quase nenhum diz que o fez por o serviço prestado pelas empresas de transportes públicos ser bom ou, pelo menos, menos mau que o uso do automóvel.
As empresas de transportes parece que não viram ou não quiseram ver isto. Continuam a propagandear os excelentes resultados em termos de utilização como se isso se devesse a melhorias do serviço por eles prestado. A Carris continua a passar a ideia que a Rede 7 está a ser um sucesso, sendo essa a razão do ganho de clientes. O Metropolitano de Lisboa afirma que isso se deve à inauguração da ligação a Santa Apolónia, a CP diz que tal se deve à reabertura do Túnel e Estação do Rossio (em Lisboa) e aos investimentos feitos em material nos últimos anos (no Porto).
Mas se as pessoas afirmam que fizeram esta mudança apenas porque os combustíveis estão caros, o que acontecerá quando o preço (relativo ou absoluto) destes baixar? Ou quando os carros eléctricos ou movidos a pilha de hidrogénio (também são eléctricos, sendo o hidrogénio usado apenas para gerar a electricidade) se tornarem mais acessíveis e mais fiáveis? E estes cenários ainda se agravam mais pela atitude das várias administrações das diversas empresas, que insistem em passar a ideia que as políticas que têm seguido estão a ter bons resultados, escondendo assim a realidade dos transportes públicos em Portugal.
Esperemos para ver o que o futuro nos reserva.