segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Por comodismo

Há a ideia em Portugal de que os portugueses não usam os transportes públicos por comodismo. Acredito que em muitos casos isso até possa ser verdade. Basta ver os nossos dirigentes políticos ou empresariais que, invariavelmente, se deslocam uns em carros oficiais, outros em carros da empresa, em ambos os casos sempre com motorista. Temos ainda os engarrafamentos imensos que param todas as cidades portuguesas, tenham ou não elas redes de transportes públicos.
Mas quando começo a olhar para aquilo que essas redes oferecem começo a ficar com dúvidas sobre as razões que levam muitas pessoas a não usarem os transportes públicos.
Há situações em que para se fazer uma viagem de autocarro se demoram 45 minutos, quando a mesma viagem feita de automóvel demora cerca de 15 a 20 minutos. Será comodismo preferir o automóvel? E não se está, ainda, a falar do tempo de espera por esse autocarro. Quantas vezes não se passa mais tempo à espera do transporte que em viagem? Quando tal acontece, será possível críticar as pessoas que optam pelo transporte individual, acusando-as de comodismo? E nas situações onde as ligações entre os vários transportes simplesmente não existem ou funcionam mal? Sim, convém não esquecer que serão poucas as pessoas neste país que usam apenas um meio de transporte para irem de casa para o trabalho e vice-versa. Se do total do tempo de viagem, cerca de metade for dispendido nesses transbordos, não será mais ajuízado a opção pelo carro, mesmo com engarrafamentos pelo meio?
Não será este "comodismo" mais uma reacção à má qualidade dos transportes? O que se passou na zona do Porto não deixa de ser curioso, atendendo a que estamos a falar de um país de "comodistas". Com a abertura do metro do Porto e a reformulação da oferta da CP, com a criação de novos serviços e a colocação em serviço de novas composições, o número de passageiros transportados aumentou em toda a rede de transportes do Grande Porto, assistindo-se em muitos eixos a uma passagem do transporte individual para o colectivo.
Terão deixado de ser comodistas? Ou terão os transportes daquela área metropolitana tido um aumento qualitativo e quantitativo que justificou essa mudança? E se assim foi, será que noutros lados as pessoas não usam os transportes apenas por comodismo? Ou será que estes simplesmente não satisfazem as necessidades das pessoas?
Não passará a desculpa do comodismo de uma forma simplista de ver o problema dos transportes em Portugal? Afinal sempre é mais cómodo para os transportadores e responsáveis políticos dizer que a culpa é do comodismo das pessoas do que tentar descobrir as verdadeiras razões das coisas serem assim.
É irónico, não é?

2 comentários:

  1. mas é uma escolha, não é? porque então as pessoas se estabilizam o suficiente pra andarem de carro, ao invés de abrirem a boca pra reivindicar aquilo que elas julgaram por negativo?

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  2. Muitas nunca reclamam, apenas refilam, e nisso tem toda a razão.
    Mas há quem o faça para os sítios certos, como eu já o fiz, e que como resposta leve com coisas fantásticas, que nada têm a ver com a realidade que se vive e se sente na prática (e tenho alguns casos desses no meio dos meus posts, é uma questão de os procurar por Carris), e raramente ou nunca se vê nada para minorar os problemas que possam haver - e que as empresas têm obrigação de os conhecer, sem necessidade de "avisos à navegação" por parte dos clientes!
    Claro que o resultado disso é a escolha, em muitos casos acertada, pelo automóvel. O tempo que se ganha e a liberdade de deslocação assim obtida compensa, e bem, o tempo perdido em engarrafamentos e o dinheiro gasto na manutenção de um automóvel (combustível incluido).
    E olhe que eu até nem conduzo (apesar de ser encartado) e até trabalho numa importante empresa de transportes públicos.

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