terça-feira, 4 de outubro de 2011

Gostava de andar de eléctrico

Assim mesmo, no pretérito imperfeito! Gostava, não no sentido de "gostaria", mas mesmo no sentido de "já não gosto"!
Gostava de andar de eléctrico quando a rede lisboeta destes veículos era parte integrante do sistema de transportes públicos da cidade. Quando havia muitos eléctricos a circular e de várias séries bem distintas entre si.
Tudo isso acabou.
Das poucas vezes que andei de eléctrico nos últimos tempos, fiquei com a sensação de que aquilo já não é uma parte integrante (e importante) da rede de transportes da cidade, mas apenas uma rede turística [já não tão] low-cost, com os veículos carregados essencialmente de turistas e carteiristas!
E por falar em veículos, não consigo gostar dos que circulam actualmente! Parece-me que só se podem conduzir com arranques repentino e forte acelerações que fazem com que a velhinha do primeiro banco acabe na plataforma da retaguarda! E as patinhagens que isso provoca... Aí nem se fala! Têm dúvidas? Vejam a quantidade de areia que está sobre os carris mesmo em zonas planas, como o terminal dos Prazeres!
As descidas íngremes deixaram de ter aquela sensação de aventura que havia nos antigos eléctricos, onde os guarda-freios paravam os carros no início das descidas (quando os paravam) para girarem a grande roda que accionava os calços ao carril. Agora limitam-se a meter com a mão esquerda pontos de frenagem no controller, enquanto com a direita dizem adeus a quem passa.
Não nego que para um guarda-freio (e guarda-freias) as descidas de agora sejam muito mais relaxantes e tranquilas que as de antigamente, mas a verdade é que perdeu-se muito com o fim daquele ritual de "pôr calço ao carril".
Acresce a tudo isto a dificuldade que um lisboeta tem actualmente em viajar de eléctrico na sua própria cidade. Apenas existem 5 carreiras em circulação! Dessas 5, uma funciona apenas de segunda a sexta até cerca das 20:00, uma segunda no mesmo período de tempo e ainda aos Sábados de manhã até cerca das 14:00. Restam as outras três, as que por razões geográficas pertencem à tal rede turística low-cost: o 12, o 15 e o 28!
Para se viajar em todas elas, principalmente nas duas últimas, é necessária uma grande dose de boa vontade e espírito de sacríficio, tal a quantidade de turistas (e carteiristas) que existem sempre nos seus terminais e noutras paragens importantes dos seus percursos!
É o problema de se terem tornado famosos e aparecerem em todos os cartazes turísticos da cidade.
Se eu gostaria de viajar de eléctrico? Sim, gostaria, mas nas condições de antigamente, numa rede que não seja para turista ver, com eléctricos modernos mascarados de antigos, sem carteiristas e turistas aos magotes e, principalmente, sem arranques bruscos a toda a hora e momento.

1 comentário:

  1. Caro Ricardo,

    Já tinha lido este (maravilhoso) post, com o qual concordo inteiramente. Partilho totalmente a sua análise e os seus sentimentos em relação ao lugar do eléctrico hoje. Tal como dizia, também eu gostava de andar de eléctrico quando este fazia parte da rede de transportes públicos da cidade. E também eu detesto os eléctricos cheios que nem latas de sardinhas, é degradante para quem lá trabalha, que tem de trabalhar sob pressão e aturar com todo o tipo de gente, é duro para quem os utiliza, que não viaja em condições decentes. Felizmente que há momentos do dia em que se pode ter a sorte de viajar num quadro confortável, sem os tais magotes de turistas (coitados!). No entanto, eu continuo a ser uma defensora do eléctrico: é que com ele é toda a nossa relação com o que nos rodeia que necessita de ser revista e não o contrário, do meu ponto de vista. Lembro-me do tempo em que passava um eléctrico aqui no meu bairro e que ia, se não me engano, do Cais do Sodré a Campo de Ourique. Faz falta essa linha (ou esse troço), e nenhum autocarro os veio substituir. Concordo que o autocarro (e o metro?) vêm substituir muitas das carreiras do eléctrico, do ponto de vista funcional. Mas se quisermos ter em conta outras critérios, então o eléctrico tem toda a razão para se manter e mesmo desenvolver. Claro que concordo quando diz que há carreiras que não fariam qualquer sentido hoje em dia, mas outras há que se justificariam plenamente. E subscrevo o que que escreveu: "Se eu gostaria de viajar de eléctrico? Sim, gostaria, mas nas condições de antigamente, numa rede que não seja para turista ver".


    Um abraço.

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